Tu, moribundo...

22-07-2015 22:51

O mundo diluído na garganta, por uma garrafa de aguardente,

Desce pelo peito abaixo, como um gládio que rasga carne, até perfurar o coração

O mundo expelido sinistramente pelas sarjetas do peito, que abandona o ardor prepotente

De usar um manto tenebroso, cobrindo de negro as muralhas da comoção

 

Tudo como num animatógrafo numa tela do tamanho do planisfério que nos abarca,

Onde se rasgasse o presente, moribundo, para se coexistir numa utopia, de um futuro,

Um futuro de bonança e crédito pessoal, onde a mulher é sempre a matriarca

E homem o rosto glamouroso, a quem o requinte pertence e que de novo já é maduro

 

Mas a vida passa-nos indiferentemente diante da incrédula tentação de a abandonar

E tornámo-nos reféns, como um criminoso que se deixa vencer no cárcere e nele se deita,

No chão frio da cela, vendo os passos do carcereiro, dia após dia, sem os conseguir contar

E de ver a vida passar, a pele torna-se no livro da sapiência cuja leitura se encontra desfeita

 

Tu, moribundo, que estás prostrado na calçada lusitana,

És os olhos em mágoa de quem passa ao sabor do vento e tem medo de te olhar

És a criança perdida, que tem as pragas da vida incrustadas no corpo, e que o mundo tem medo de ajudar

És o sábio empírico que não teve os pontos de apoio para que pudesse erguer o mundo com gana

 

Tu, moribundo, és a estrela que já não existe, mas que continua a cintilar no firmamento,

Para que os humanos te olhem, morto, mas te julguem vivo, e aí encontrem extasiante significação

Porque os passageiros são somente viandantes desesperados por solução

E que, por medo, ficam cegos, esquecendo-se que é na humanidade, em ti, moribundo, que se evade o tormento

Este poema é dedicado a todos os moribundos do mundo, os de corpo e os de alma.

Tópico: Tu, moribundo...

;-)

Data: 27-07-2015 | De: Cristina

Bem profundo...

Re: ;-)

Data: 02-08-2015 | De: Elizabete Leonora

Muito obrigado pela partilha :)

Novo comentário