Esta vida é para quem ousa, mas nasci porque me ousaram

10-07-2015 20:26

Penso o peso de uma pena – paciência penetrante de uma paz pura e plácida

Nada mais jaz no meu leito – sou apenas eu,

E eu nem tenho impressão rugosa da paz que me embala

Mas do fundo do céu, negro como o vazio da vida, vêm ecos combalidos, torpes e enfermos,

O ruído estertor da gruta faz-me nascer, a luz queima-me os olhos, o coração, a pele, e sinto,

Sinto necessidade impiedosa por existir, e berro pelo meu espaço,

Berro pela violenta necessidade em respirar, em existir,

E, no entanto, não gritaria se não estivessem, ali, outros para me ouvir

Porque a nossa voz é o ouvido dos outros

 

Agora, não penso, limito-me a receber injeções aditivas de adrenalina, ecos de outras vidas,

Suores de expetativas recaem vãmente sobre os meus ombros,

Sorrisos de falsidade, de quem sabe que vida é pele de beringela, depois de golpeada

Sou a existência bradejada pelo fundo do autoclismo

Sou um pintainho perdido no meio de uma alcateia de lobos esfaimada

No cume das torres que me erguem, vejo vultos, vultos brancos com o condão da vida nas mãos

Vejo vida saída da agonia, e, por detrás das paredes, onde as mãos são parteiras,

Cheiro a carnificina, a malvadez arrotada em mãos engorduradas por nacos suculentos de carne

Cheiro a carne apodrecida, daqueles que abandonaram mal a vida, os mortos-vivos,

Que nem ousaram matar-se, nem matar para viver

Esta vida é para quem ousa, mas nasci porque me ousaram 

Tópico: Esta vida é para quem ousa, mas nasci porque me ousaram

o teu poema

Data: 03-08-2015 | De: nidia

O percurso do poema...

Começa com uma leveza , diria, perturbadora "Penso o peso de uma pena" para a concepção da vida como se de um fardo se tratasse.
O poema é extremamente tocante.
Parabéns pela sensibilidade.

Re:o teu poema

Data: 09-08-2015 | De: Elizabete Leonora

Obrigado pela partilha...fico muito contente por te ter conseguido tocar, por ter conseguido comunicar através destas singelas palavras :)

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